Devemos observar, além do avanço, as especificidades do ensino remoto
Por Luíz Claudio Costa
O Censo da Educação Superior de 2022, divulgado pelo Inep, mostrou um acentuado aumento de ingressantes e matrículas na modalidade EAD (ensino a distância). De 2018 a 2022, o número de estudantes matriculados no formato cresceu 112%, chegando a 4,39 milhões, enquanto o total de estudantes matriculados no presencial caiu, no mesmo período, 21% (5,1 milhões). Evidentemente que os números chamam a atenção e merecem ser analisados, mas isso não pode se dar por análises superficiais e apressadas.
Inicialmente, é preciso considerar que, desde novembro do ano passado, quando do lançamento do ChatGPT, que alcançou mais de 1 milhão de usuários em cinco dias, vários países e estudiosos do mundo estão analisando os impactos da Inteligência Artificial Generativa (IAG) em vários setores, inclusive na educação. O Brasil precisa participar desse debate, mas mesmo antes da IAG, o setor em todo o planeta passou por uma intensificação da educação mediada pela tecnologia que, mesmo sem ser uma educação a distância estruturada, foi o que permitiu que fossem reduzidos os impactos da pandemia no ensino.
Universidades e escolas de diferentes partes do globo migraram rapidamente para a educação remota, mediada por tecnologia. A educação mediada por tecnologia é uma realidade e continuará sendo cada vez mais utilizada. A EAD dos tempos atuais nada mais é do que uma educação mediada por tecnologia, mas que demanda método, material e capacitação.
A discussão que precisa ser feita com urgência em um cenário de expansão acentuada é sobre qualidade. A EAD pode ser tão boa quanto a presencial; aliás, deveríamos deixar de falar em educação presencial e educação a distância e falarmos em educação em diferentes níveis de presencialidade, onde cada instituto de ensino superior e cada curso teriam condições de definir o nível de presencialidade compatível com suas especificidades.
A avaliação de um curso EAD é completamente diferente da de um curso presencial; os indicadores e processos são distintos. Em 2024 estaremos comemorando 20 anos do Sinaes (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior), que prestou um grande serviço à educação brasileira, mas que precisa ser revisto. Não podemos continuar, em tempos atuais, fazendo uma avaliação que mais se assemelha a uma auditoria acadêmica. Precisamos, e temos competência instalada no Inep para isso, de uma avaliação que induza melhoria de qualidade.
Outro fato que precisa ser considerado, antes de qualquer decisão precipitada em relação ao EAD, é que existem no Brasil mais de 9 milhões de jovens, de 18 a 24 anos, que terminaram o ensino médio e não frequentam o ensino superior. A esses jovens precisa ser ofertada a oportunidade de acesso ao ensino superior de qualidade. No entanto parece evidente que o ensino presencial, com salas de 50 pessoas, não conseguirá atender a essa demanda. Assim, o EAD de qualidade é importante instrumento de inclusão social.
Outro aspecto é que um dos fatores do avanço da modalidade é a falta de programas de inclusão e permanência dos alunos mais carentes no ensino superior. Assim, os que desejam estudar, mas não possuem recursos financeiros, buscam o EAD para realizar os seus sonhos. Tenho a convicção de que, com programas adequados de inclusão, o crescimento do EAD ocorreria, porém de forma menos acentuada.
Atento à expansão da modalidade EAD nos últimos anos, o ministro Camilo Santana abriu uma consulta pública sobre o assunto. Entendo ser esta uma oportunidade para se chegar a uma proposta de uma educação a distância de qualidade, que permita que aqueles que no passado não puderam e agora desejam realizar um curso superior possam fazê-lo. Se olharmos somente os números a distância, estaremos na contramão da história e ampliando a desigualdade e a exclusão.
Fonte: Folha de S.Paulo